segunda-feira, junho 02, 2008

As minhas selecções, parte 1

Tenho andado a pensar muito no meu percurso enquanto torcedor futebolístico a nível das nações, a nível das selecções. Depois de ter mudado as cores aqui no Anauel, depois de ter afixado o statement lateral e de ter dado à estampa os meus cromos para o próximo Europeu de Futebol, enfim, depois do meu coming out {lol}, dei comigo a investigar, a introspectar {?}, a puxar pela memória, a procurar momentos-chave, acontecimentos marcantes. No fundo, e resumindo, tenho andado entretido a mapear, a traçar um percurso, a narrar uma história que já leva, dou-me agora conta, uns bons 26 anos de idade. Têm sido dias muito interessantes, por isso os decidi partilhar convosco, estes em que me tenho entretido a escrever sobre as minhas selecções. Sim, porque se agora torço pela Holanda, tempos houve em que torci por outros países. A tradição, pelos vistos, vem de longe...


A primeira selecção que apoiei foi a do Brasil de Sócrates e companhia. Era forçoso que assim fosse, pode dizer-se, uma vez que o meu primeiro Mundial foi o de 1982, o do Naranjito, em Espanha. Foi nesse ano que acompanhei com algum interesse {difícil saber o quanto}, pela primeira vez, um acontecimento desta natureza. O Euro de 1980 {em Itália} e o Mundial de 1978 {na Argentina} passaram-me ao lado, mas o Naranjito cativou-me {e como não?} e despertou-me para esta realidade dos países, com exércitos de 11, em grupos de 4 e depois em eliminatórias a doer, todos com um único objectivo, o de erguer a taça. Bom, as regras eram estas e estavam entendidas, mas faltava-me algo. Torcer por alguém. Portugal não estava lá {embora figure na caderneta dos cromos de então...}, mas eu queria na mesma jogar aquele jogo. Logo, era preciso torcer por outro alguém. E o Brasil pareceu-me a solução óbvia, ou possível, ou alguém mo suspirou? E naquela altura, do alto dos meus 11 aninhos, eu convenci-me de que aquela era uma turma especial. Fiquei hipnotizado. Não sei se era o azul e o amarelo, se a barba do Sócrates {eu diria que é impossível ficar indiferente a um jogador de barba...}, se era aquele ar doidão do Falcão, se a magia do Zico, mas aqueles eram decididamente os meus tipos. Para quem, como eu, começava naquele momento a admirar aqueles duelos colectivos, aquelas guerras pacíficas {ou nem tanto}, aquele Brasil era a escolha óbvia. E naquele fatídico jogo frente a Paolo Rossi {nunca um hat-trick, numa altura em que nem sequer sabia que tal coisa existia, me soube tão mal...} eu saboreei o amargo da derrota, a injustiça injustificável. Foi um baptismo terrível. Ali começava a minha devoção ao mundo da bola e ali eu chorei pela primeira vez por causa de um resultado de um jogo de futebol. Encontrava-me de férias no hotel da Torralta {o amarelinho; o mesmo amarelinho do escrete...} na serra da Estrela com o meu pai, nunca me esquecerei. Vi o jogo dentro do hotel, numa televisão na sala de estar, em silêncio, angustiado. Terminado o jogo, fui dar uns toques de bola, na relva, lá fora, com o meu pai. Sempre em silêncio. Aguentando em surdina algo de muito estranho para mim. Até que rebentei e chorei como a criança que era. É isto que guardo daquele que foi, provavelmente, o melhor escrete canarinho de sempre. A minha primeira selecção, como as primeiras escolhas?, foi efémera e amarga...


Não podia, portanto, ter grande sucesso em mim esta minha primeira selecção. O choque tinha sido grande demais. Eu tinha apostado nos tipos mais curtidos do campeonato, estava apaixonado, e eles desgraçavam-me assim. Mas o jogo, a geometria do campo, os árbitros, os hinos, o cerimonial, a tensão, as transmissões televisivas, a euforia e a tristeza nas bancadas, esses, já me tinham conquistado. E eu queria continuar a jogar aquele jogo! E enquanto procurava nova turma dei de caras com o Aberdeen FC. Naqueles anos de 82, 83, 84 o Aberdeen, vermelho na Escócia, como o Liverpool em Inglaterra e o Benfica em Portugal, era a minha equipa. Naquele Aberdeen reinavam, sob a batuta de Alex Ferguson, jogadores como MacLeish, Leighton e aquele que era o meu herói do momento, Gordon Strachan. Se a esses juntássemos Souness e Dalglish obtinhamos metade de uma selecção pela qual eu poderia torcer, pensei então. Embora, se puxar bem pela cabeça, nem tenho bem a certeza se alguma vez assisti e puxei pela Escócia num jogo oficial de alguma competição... em 1984 {a competição seguinte} era já outra a minha selecção... Sei que ponderei, tentei adoptá-los, tentei amalgamar o Aberdeen vitorioso com a Escócia anódina, e sei que falhou. Foi fugaz, não se materializou, mas a Escócia parecia-me uma boa escolha, então. Já os conhecia um pouco do Mundial de 1982 {tinham ganho por 5-2 à Nova Zelândia e tinham perdido por 4-1 frente ao Brasil; resultados impressionantes...} e Strachan era tudo para mim. Além de que, na altura, e estas coisas são muito importantes, por muito que possa parecer ridículo, a minha maior paixão era copiar à vista emblemas e marcas {chocolates, tabaco, automóveis, clubes, you name it...}. E a Escócia, além de uma bandeira simples e elegante, tinha o Leão Rampante!, um desafio do caraças, numa espécie de êxtase adicional. As horas que eu passei a desenhar aquele leão... Mas o Aberdeen, que tinha ganho a Taça das Taças {frente ao Real Madrid} em 1982-83, dando-me uma alegria de fazer esquecer o desaire canarinho do ano anterior, já no ano seguinte me fez passar pelo mesmo martírio, o das lágrimas. E com isso, creio, esfumou-se o apoio à Escócia... Quando tudo indicava que iriam repetir a proeza na edição de 1983-84, eis que, nas meias-finais, frente ao FC Porto {e, na verdade, é daí que vem o meu "ódio" aos tripeiros...}, acabaram por cair, tão perto da final {que o FCP perderia para a Juventus}, num jogo que igualmente não esquecerei. E no fim do qual chorei, uma vez mais, copiosamente. Eram já lágrimas a mais.

{continua}


Update - Acabei agora mesmo de me lembrar de como o meu apreço pela Escócia está certamente relacionado com a minha primeira paixoneta de Verão... Chamava-se Fiona, mergulhei e nadei lado a lado com ela, inúmeras vezes nos deitámos na relva do hotel a olhar as estrelas, e... era escocesa.

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