terça-feira, janeiro 11, 2011

O drama da minha vida...

«A imagem que um indivíduo faz da nação de que forma parte é também, portanto, uma componente da imagem que ele tem de si mesmo, a sua "auto-imagem". A virtude, o valor e o significado da nação também são os dele próprio. As teorias sociológicas e psicossociais correntes, na medida em que se interessam por tais problemas, oferecem o conceito de identificação para reflexões sobre fenômenos desse gênero. Entretanto, é um conceito não inteiramente adequado para o que realmente se observa neste caso. O conceito de identificação faz parecer que o indivíduo está aqui e a nação ali; subentende que "indivíduo" e "nação" são duas entidades diferentes, separados no espaço. Como as nações consistem em indivíduos, e os indivíduos que vivem nas mais desenvolvidas sociedades-Estados do século XX pertencem, na grande maioria dos casos, de forma inequívoca, a uma nação, uma conceituação que evoque a imagem de duas diferentes entidades separadas no espaço, como mãe e filho, não se ajusta aos fatos.
As relações desse tipo só podem ser adequadamente expressas em termos de pronomes pessoais. Um indivíduo não só tem um "eu-imagem" e um "eu-ideal", mas também um "nós-imagem" e um "nós-ideal". É um aspecto central da nacionalização do ethos e do sentimentos individuais, o qual pode ser observado empiricamente nas sociedades-Estados industriais dos séculos XIX e XX, que a imagem dessas sociedades-Estados, representada, entre outros, por símbolos verbais como "nação", constitui uma parte integrante dos "nós-imagens" e dos "nós-ideais" da maioria dos indivíduos que formam, uns com outros, sociedades desse tipo. [...] Dizer "Sou russo, americano, francês", ou seja o que for, subentende usualmente "Eu e nós acreditamos em idéias e valores específicos", "Eu e nós suspeitamos e sentimo-nos mais ou menos antagônicos em relação a membros desta ou daquela nação-Estado", "Eu, assim como nós, temos vínculos e obrigações em relação a esses símbolos e á coletividade que eles representam". Além disso, a imagem desse "nós" forma parte integrante da organização da personalidade do indivíduo que, nesses casos, usa os pronomes "eu" e "nós" com referência a si mesmo.» Norbert Elias, Os Alemães. A luta pelo poder e a evolução do habitus nos séculos XIX e XX, Jorge Zahar Editor, 1997.

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